O REINO OCULTO DOS MAIAS: DESVENDANDO O PASSADO E DESBRAVANDO O FUTURO

Osdois  arqueólogos, ambos exploradores da National Geographic, tinham passado, em conjunto, várias décadas a trabalhar nas selvas da América Central. O calor e a humidade sufocantes, bem como os encontros com animais selvagens mortíferos e salteadores armados, eram uma componente intrínseca da descoberta dos tesouros deixados pelos antigos maias, cuja civilização floresceu durante milhares de anos e depois desapareceu misteriosamente sob a floresta densa.

Por isso, pareceu-lhes uma ironia – quase uma injustiça – que a sua maior descoberta ocorresse quando os dois estavam debruçados sobre o computador num gabinete com ar condicionado em Nova Orleães. Enquanto o seu colega assistia, Marcello Canuto, da Universidade Tulane, abriu a imagem aérea de um segmento de floresta na região setentrional da Guatemala. No início, o ecrã mostrava apenas a copa das árvores. Só que esta imagem fora obtida por meio de uma tecnologia denominada LiDAR (acrónimo de “light detection and ranging”). Os dispositivos de LiDAR instalados numa aeronavedisparam milhares de milhões de descargas de laser sobre o solo e, em seguida, medem as que são reflectidas de volta. A pequena fracção dos impulsos que penetram na folhagem fornece nuvens de dados suficientes para compor uma imagem do solo da floresta.

O LiDAR é uma tecnologia laser capaz de remover digitalmente, por exemplo, a copa de uma floresta. O resultado? Algumas revelações inesperadas.

Com uns quantos toques no teclado, Marcello removeu a vegetação e revelou uma imagem tridimensional do solo. Longe de centros urbanos, pensava-se que a região que estavam a inspeccionar se mantivera maioritariamente desabitada, mesmo no auge da civilização maia, há mais de 1.100 anos.

De repente, porém, aquilo que até então pareciam vulgares colinas fora afinal esculpido pela construção de albufeiras artificiais, socalcos agrícolas e canais de irrigação. Aquilo que pareciam ser pequenas montanhas eram grandes pirâmides, coroadas por edifícios cerimoniais. Povoados que, até então, os arqueólogos tinham definido como capitais regionais eram, afinal, meros subúrbios de cidades pré-colombianas muito maiores, cuja existência ninguém conhecia, unidas entre si por auto-estradas elevadas e calcetadas.

Aquilo que pareciam ser pequenas montanhas eram grandes pirâmides, coroadas por edifícios cerimoniais.

Segundo Thomas Garrison, parceiro do projecto de Marcello Canuto, “acho que estávamos a sentir algo semelhante ao que os astrónomos sentiram quando olharam através do Telescópio Hubble e viram todos os espaços vazios subitamente cheios de estrelas e galáxias. Quando removemos as árvores, havia marcas humanas por toda a parte.”

PROCESSO DE REVOLUÇÃO EM CURSO

A utilização da tecnologia LiDAR está a revolucionar a arqueologia maia, não só por conduzir os investigadores a sítios arqueológicos promissores, mas também por proporcionar um quadro completo da paisagem antiga. As dezenas de levantamentos realizados com tecnologia LiDAR, incluindo o projecto inovador de 2018 apresentado em Nova Orleães e financiado pela Fundação Guatemalteca para o Património Cultural e Natural dos Maias (Pacunam), vieram alterar ideias há muito enraizadas de que esta civilização prosperara numa das regiões menos hospitaleiras da Terra.

“É quase impossível exagerar a importância da tecnologia LiDAR para a arqueologia maia”, diz o arqueólogo guatemalteco Edwin Román-Ramírez. “Será sempre preciso fazer escavações para compreendermos o povo que construiu estas estruturas, mas esta tecnologia mostra-nos com exactidão onde e como escavar.”

“Quando removemos as árvores, havia marcas humanas por toda a parte.” 

Thomas Garrison

As imagens de LiDAR deitam abaixo a ideia de que as terras baixas dos maias eram uma paisagem escassamente povoada, salpicada por um punhado de cidades estado autónomas e dispersas.

Cada novo levantamento feito com esta tecnologia torna cada vez mais clara a noção de queos maias eram uma civilização interligada de escala e complexidade notáveis. No fundo, constituíram uma megalópole maia, com milhões de agricultores, combatentes e construtores de infra-estruturas, mais extraordinária do que alguém poderia alguma vez ter imaginado. Esta revelação tem o poder não só de reescrever o passado da região, mas também de reformular radicalmente o seu futuro.

Para a Guatemala, país economicamente empobrecido, mas rico em tesouros culturais e ecológicos, estas descobertas proporcionam possibilidades excitantes: muitos dos novos sítios arqueológicos podem transformar-se em peças centrais de uma indústria cultural e ecoturística capaz de ajudar o país a superar a pobreza de forma sustentável. No entanto, para Francisco Estrada-Belli, Edwin Román-Ramírez e outros arqueólogos e conservacionistas guatemaltecos, estas imagens de alta tecnologia vieram também pôr a descoberto uma evolução mais inquietante, que pode inviabilizar por completo esses planos: as reveladoras marcas de salteadores, madeireiros ilegais, acumuladores de terras e narcotraficantes que estão a montar o cerco à segunda maior área de floresta tropical remanescente das Américas. Há muito em jogo e os guatemaltecos temem ser derrotados na sua corrida para proteger as paisagens e os tesouros que poderiam esclarecer melhor tudo o que os antigos maias têm para nos ensinar.

Na Guatemala, esta tecnologia pôs a nu marcas de salteadores, madeireiros ilegais, acumuladores de terras e narcotraficantes que estão a montar o cerco à segunda maior área de floresta tropical remanescente das Américas.

Grande parte do património cultural mais importante do país encontra-se protegido dentro da Reserva da Biosfera Maia, um vasto conjunto de parques nacionais, reservas de vida selvagem e concessões florestais onde os habitantes obtêm madeira e outros produtos florestais. Abrangendo cerca de um quinto do território da Guatemala, esta reserva é habitada por jaguares e araras-escarlate, além de centenas de outras espécies de aves, borboletas, répteis e mamíferos.

Em contraste com outros berços de civilização mais áridos, como o Egipto e a Mesopotâmia, as florestas húmidas da América Central raramente têm revelado com facilidade os seus tesouros enterrados. Em meados do século XIX, o escritor norte-americano John Lloyd Stephens e o seu colega e artista britânico Frederick Catherwood exploraram algumas das cidades abandonadas dos maias, na península mexicana do Iucatão. As suas descrições e desenhos de pirâmides e palácios cobertos pela selva atraíram outros investigadores, mas, após décadas de escavações, os arqueólogos só conseguiram abrir algumas pequenas janelas para o mundo maia.

O CASO DE CARACOL, NO BELIZE

Em 2009, os arqueólogos Diane e Arlen Chase, actualmente na Universidade de Houston, experimentaram uma abordagem nova em Caracol, uma cidade antiga no Belize onde escavavam desde 1985. O equipamento LiDAR, inicialmente utilizado para meteorologia e rastreio de corpos celestes, estava a ser instalado em aeronaves para ajudar em trabalhos de cartografia e levantamentos. A arqueologia aproveitou.

“No princípio do projecto, pensávamos que Caracol era apenas um punhado de pirâmides e conjuntos de templos”, conta Arlen Chase. “Mas quando fizemos o levantamento das áreas circundantes com o LiDAR, descobrimos que, afinal, era uma cidade enorme e bem planeada.” Os achados do casal despertaram a atenção de outros arqueólogos.

Em 2021, escavações baseadas nos dados da Pacunam proporcionaram surpresas até em Tikal, o maior sítio arqueológico da Guatemala. A cidade era pelo menos quatro vezes maior do que se pensava e estaria parcialmente rodeada por um fosso enorme e por uma muralha defensiva que se prolongava ao longo de vários quilómetros. Também se descobriu uma grande pirâmide e um complexo que, aparentemente, alojava uma comunidade originária de Teotihuacan, uma antiga superpotência situada mais de 1.250 quilómetros a oeste.

“A descoberta de monumentos importantes no coração de Tikal vem reforçar a quantidade de portas que o LiDAR pode abrir”, afirma Edwin Román-Ramírez, responsável pelo Projecto Arqueológico do Sul de Tikal. “Descobrimos estruturas que não descortinávamos mesmo quando andávamos em cima delas.”

“A descoberta de monumentos… reforça as portas que o LiDAR pode abrir. Descobrimos estruturas que não descortinávamos mesmo quando andávamos em cima delas.”

Edwin Román-Ramírez

O PODER DE EL MIRADOR

Cerca de 70 quilómetros a noroeste de Tikal, o arqueólogo Richard Hansen sobe a um aterro baixo e faz uma pausa para soltar a lama das botas. “Há alguns anos, transferimos a nossa rota de abastecimento para este troço, mais alto e mais seco”, conta este explorador da National Geographic, co-responsável pela investigação na antiga cidade de El Mirador. “Só quando recorremos ao LiDAR é que nos apercebemos de que estávamos a caminhar numa antiga auto-estrada.”

Este caminho encontra-se agora coberto por meio metro de terra, mas há vários séculos erguia-se quase dois metros acima do pântano circundante e estava pavimentado com estuque. Integrado numa complexa rede de estradas que unia Mirador a mais de quatrocentos povoados antigos, o caminho aumenta para 40 metros de largura ao aproximar-se do centro da cidade antiga, largura semelhante à de uma auto-estrada moderna com oito faixas de rodagem.

“Consegue imaginar quantas pessoas se deslocavam por este caminho para justificar os recursos investidos na construção de algo assim?”, pergunta Richard. Segundo a datação por carbono e as análises ao pólen e aos solos, o sítio começou a ser ocupado em 2600 a.C. No seu apogeu, entre 300 e 100 a.C., El Mirador poderá ter sido uma das maiores cidades do continente.

A razão que teria conduzido à sua escolha permanece um mistério, uma vez que não dispunha de um abastecimento de água constante ao longo do ano. No entanto, o ambiente não é favorável às sociedades humanas em nenhum ponto das terras baixas do território maia. Os escassos nutrientes disponíveis no solo são regularmente arrastados por chuvas torrenciais, muitas vezes seguidos por secas devastadoras.

Segundo a investigação de Richard Hansen, o crescimento demográfico de El Mirador foi possibilitado pela remoção de lamas férteis dos pântanos das terras baixas, seguida da sua transferência para socalcos abertos nas encostas das colinas. Os agricultores aumentaram o pH do solo, acrescentando-lhe calcário e obtendo assim safras abundantes de milho, abóbora, feijão, pimento e algodão.

Segundo a datação por carbono e as análises ao pólen e aos solos, o sítio começou a ser ocupado em 2600 a.C.

Numa região assolada por precipitação ora escassa ora excessiva, o fluxo de água era meticulosamente controlado através de canais, barragens, albufeiras, cisternas e socalcos agrícolas – uma infra-estrutura que está agora a ser posta a descoberto. “Não era possível alimentar tantas pessoas como os antigos maias alimentavam praticando o tipo de agricultura de queimada actualmente utilizado nesta região do planeta”, afirma Marcello Canuto, especialista em modelação da densidade demográfica. De acordo com os seus cálculos, 10 a 15 milhões de habitantes viviam no reino dos maias aquando do seu apogeu, incluindo muitas comunidades em zonas pantanosas consideradas inabitáveis.

Para construir a alta pirâmide de El Mirador, com 72 metros, conhecida como La Danta, exércitos de operários utilizaram percutores e lâminas de obsidiana para cortarem e perfurarem o calcário, separando em seguida os blocos de pedra. Richard e os seus colegas de investigação reproduziram o processo, utilizando ferramentas descobertas nas pedreiras do sítio arqueológico como modelos. Os operários construíram padiolas de madeira para transportar blocos com cerca de 400 quilogramas. “Dispondo de um número suficiente de homens e de meios para alimentá-los, um rei conseguiria concluir a obra no seu tempo de vida”, propõe o arqueólogo.

Porém, muitos sítios arqueológicos recém-descobertos não são desconhecidos dos salteadores. “O Estado não tem os recursos necessários para proteger o nosso património”, diz Marianne Hernández, presidente da Fundação Pacunam.

“Com estes novos dados, estamos pelo menos a tentar perceber a localização dos sítios. Se tivéssemos um exército de arqueólogos, poderíamos enviá-los para o campo a fim de estudá-los, antes de estes serem destruídos.”

Os salteadores são apenas uma das ameaças enfrentadas pela Reserva da Biosfera Maia. Os colonos ilegais costumam atear fogos para abrir clareiras para ranchos ganadeiros, com frequência utilizados por narcotraficantes para branqueamento de capitais. Muitos abriram pistas de aviação no meio da floresta.

O governo da Guatemala desenvolve esforços para travar a desflorestação, mas as florestas de crescimento antigo já diminuíram cerca de 20% ao longo das últimas duas décadas. Há também tentativas de recuperar território ilegalmente ocupado, mas o trabalho é dificultado por falta de equipamento, de combustível, de informação fiável e de métodos bem definidos para lidar com as comunidades invasoras.

“Os vigilantes do parque realizam uma missão impossível”, afirma Roan Balas McNab, antigo responsável pelo gabinete guatemalteco da Wildlife Conservation Society. “Não têm recursos suficientes.”

UM COMBOIO E UM santuário binacional

O turismo poderá ser uma forma de reforçar esses recursos. Do outro lado da fronteira, no Sudeste do México, sítios arqueológicos maias como Chichén Itzá e Palenque atraem milhões de turistas todos os anos e são poderosas alavancas das economias locais. O México está também a construir uma linha férrea polémica (o chamado Comboio Maia) para facilitar o acesso dos turistas às ruínas do interior.

Richard Hansen também gostaria de construir uma linha férrea e sonha com um comboio-miniatura capaz de transportar turistas e investigadores até El Mirador e mais oito sítios arqueológicos, impedindo simultaneamente a entrada de intrusos indesejados. “Precisamos de permitir a entrada a pessoas que querem ver e estudar estas maravilhas antigas, mantendo à distância os salteadores e os colonos, os narcotraficantes e os madeireiros”, afirma.

O arqueólogo propôs a criação de um santuário binacional que seria a primeira área selvagem da América Latina sem estradas, veículos e aviões – acessível apenas por comboio –, e chegou mesmo a contratar os serviços de um lobby em Washington, na esperança de que o Congresso norte-americano atribua 68 milhões de euros para construir a ferrovia e estruturas ecológicas capazes de criar postos de trabalho para os guatemaltecos e contribuir para travar o afluxo de migrantes económicos à fronteira norte-americana. A sua proposta, como explica, “protegeria o habitat e a vida selvagem, viabilizando simultaneamente uma economia sustentável capaz de empregar as comunidades locais”.

Embora Richard Hansen tenha conseguido mobilizar alguns apoios no governo da Guatemala, alguns guatemaltecos acham que ele está a apropriar-se do património cultural do país em benefício próprio, transformando as terras baixas dos maias num parque temático arqueológico. O guatemalteco Francisco Estrada- Belli, que dirige o Projecto Arqueológico de Holmul, é um dos muitos arqueólogos que se opõem a este plano. “Preocupa-me que alguns apoiantes do projecto acreditem genuinamente que ele trabalha para trazer benefícios à Guatemala”, afirma. “Este plano parece servir mais para ele controlar uma grande parte do país do que para beneficiar o povo da Guatemala ou a ciência.”

Richard Hansen contrapõe, afirmando que a sua proposta foi grosseiramente deturpada por críticos que querem descrevê-lo como um “colonizador gringo”. Segundo afirma, não é sua intenção desenvolver um parque temático maia “e não tenho qualquer interesse privado em termos económicos na bacia de Mirador”.

O FUTURO É SUSTENTÁVEL – OU NÃO É

Os ambientalistas também mostram relutância à ideia de vedar a região. “Há uma boa razão para não existirem outras áreas de vida selvagem na América Latina que excluam os habitantes locais que dependem dos seus recursos naturais: isso não funciona”, afirma Roan Balas Nab. “Sempre que se diz aos habitantes locais para ficarem de fora e não lhes são dadas opções de utilização sustentável dos recursos, eles tendem a fazê-lo de forma ilegal e destrutiva.”

Cerca de uma dezena de concessões florestais no interior da reserva permitem que as comunidades obtenham madeira, cumprindo directrizes rígidas. Estudos de grupos conservacionistas demonstraram que o abate de árvores realizado por essas comunidades tem exercido pouco impacte na vida selvagem e que o coberto vegetal tem permanecido constante, chegando até a crescer nalguns casos.

Por que razão abandonaram os maias as comunidades que funcionavam tão bem? Por agora, ainda não há uma resposta clara.

Na opinião de Marianne Hernández, a melhor hipótese de sucesso será uma espécie de abordagem público-privada. “O ecoturismo e o turismo cultural são decisivos para a protecção deste lugar extraordinário, mas gostaríamos que tudo acontecesse de forma respeitosa e sustentável, com a participação das comunidades locais.”

No entanto, também a Fundação Pacunam tem sido alvo de críticas por alguns guatemaltecos que denunciam o projecto da organização de construir estradas e outras infra-estruturas nesta frágil região. “A Pacunam não sabe explicar de que forma todas as suas ideias irão conservar a natureza”, diz Alejandro Santos, director do escritório da Rainforest Alliance na Guatemala. “Fala em eco-hotéis, mas a verdade é que a destruição da natureza é a mesma. Os interesses ocultos consistem em utilizar a reserva [da Biosfera Maia] para o transporte de outros tipos de recursos, como o gás natural e o petróleo.”

“Uma máquina do tempo”

No topo da ventosa pirâmide de El Tigre, pergunto a Richard Hansen o que gostaria de ver em El Mirador se não existissem impedimentos orçamentais ou tecnológicos. “Uma máquina do tempo”, diz. “Gostaria de estar aqui em cima nem que fosse durante 15 minutos, quando a cidade estava no seu apogeu. Gostaria de assistir à construção de tudo isto, de ver os exércitos de operários, escribas e artesãos, as explorações agrícolas, os funcionários régios que mobilizavam todo o processo.”

As imagens recolhidas pelo LiDAR, com o seu rigor tridimensional, tornaram mais fácil imaginar a paisagem dos antigos – as encostas das colinas em socalcos, as estradas largas e as praças espaçosas, os palácios, as oficinas e as torres de vigia. Tudo isto reforça outra pergunta: por que razão abandonaram os maias estas comunidades que funcionavam tão bem? Por agora, ainda não há uma resposta clara. Um padrão turbulento de colapso, reconstrução e ressurgimento seguiu-se a uma série de secas graves, entre meados e finais do século IX, que provavelmente destruíram as colheitas agrícolas em toda a região. Segundo Julie Hoggarth, da Universidade Baylor, que investiga os efeitos da seca sobre a agricultura e saúde dos maias, é provável que o crescimento demográfico e a abertura de clareiras contribuíssem para a degradação ambiental. “A agravar tudo isto, os reis maias eram vistos como intermediários divinos dos deuses”, diz. “Portanto é fácil imaginar que a sua legitimidade terá sido abalada se não conseguissem trazer as chuvas e que a população devastasse as cidades com violência.”

Por volta de finais do século IX, os maias começaram a abandonar os seus povoados. Pararam de construir monumentos e começaram a destruí-los propositadamente. A violência e a guerra parecem ter estado entre os factores que conduziram ao inevitável colapso da sociedade.

Certa tarde, pouco antes do pôr-do-Sol, subo ao cume de El Tigre. Uma floresta ininterrupta estende-se em todas as direcções, pontuada por elevações na paisagem – ruínas engolidas pela selva que, um dia, poderão ser escavadas e preservadas, ou saqueadas e perdidas.

“Será sempre preciso fazer escavações para compreendermos o povo que construiu estas estruturas, mas esta tecnologia mostra-nos com exactidão onde e como escavar.” 

Edwin Román-Ramírez

Acompanhado pelas vocalizações dos macacos-uivadores, desço a pé a uma antiga pedreira perto do complexo de pirâmides e palácios de Mirador. No meio da escuridão que cai, um bloco solitário de pedra cortada jaz sobre o solo, parcialmente coberto por raízes, trepadeiras e escombros. A estrutura que o bloco se destinava a integrar, fosse qual ela fosse, permanece incompleta – juntamente com o nosso conhecimento desta sociedade que, no seu tempo, alcançou níveis de sofisticação sem igual. Há ainda muito por descobrir – sobretudo quando mudamos a perspectiva que temos do mundo.

Artigo publicado originalmente na edição de Abril de 2024 da revista National Geographic.

2024-04-18T14:37:38Z dg43tfdfdgfd