ESTAS CIDADES VãO SER DEMASIADO QUENTES PARA ACOLHER OS JOGOS OLíMPICOS DE 2050

Os Jogos Olímpicos de Paris começaram com chuva, depois um calor escaldante e terminaram com uma semana de sol agradável. 

A única certeza sobre o clima dos Jogos Olímpicos de Verão é que não há certeza nenhuma.

O calor extremo é uma ameaça crescente para atletas de elite, com casos de exaustão pelo calor e insolação a tornarem-se cada vez mais comuns à medida que a poluição faz aumentar as temperaturas e os níveis de humidade. Os espectadores, especialmente aqueles que partem de zonas com climas mais frios, também são vulneráveis ao calor extremo. 

A maioria das cidades de todo o mundo não poderá ser anfitriã dos Jogos Olímpicos de Verão nas próximas décadas, uma vez que o limite de calor húmido seguro vai ser ultrapassado, de acordo com uma análise de dados do CarbonPlan, uma associação sem fins lucrativos focado em ciência e análise climática.

O quadro geral

O stress causado pelo calor extremo pode ser medido através do índice Wet Bulb Globe Temperature (WBGT em inglês, temperaturas máximas do globo húmido na tradução) - uma combinação de calor, humidade, velocidade do vento, ângulo do sol e cobertura de nuvens. A CarbonPlan descobriu que, até 2050, o stress provocado pelo calor em quase todas as cidades situadas na zona leste dos EUA ultrapassaria de longe o limite de 82,1 graus Celsius, a partir do qual os especialistas recomendam o cancelamento de eventos desportivos.

Por outras palavras, isto significa que realizar os Jogos Olímpicos de Verão nessas cidades seria um enorme risco para a saúde dos atletas.

Em 2050, a maior parte do mundo será demasiado quente para acolher os Jogos Olímpicos

Dentro de algumas décadas, grande parte da América do Norte vai ter temperaturas máximas do Globo Húmido superiores a 32 graus Celsius - altura em que mesmo curtos períodos de trabalho ao ar livre podem causar doenças relacionadas com o calor e até levar à morte.

WBGT máximo anual previsto para cidades globais, média 2040-2059:

Os estados super-húmidos ao redor do Golfo do México, da Flórida até a metade leste do Texas, estariam bem fora da mesa. Os Jogos Olímpicos realizados em 1996 em Atlanta simplesmente não seriam possíveis em 2050. 

Grande parte do leste da China, incluindo Pequim e Xangai, estaria bem acima do limite, assim como Hong Kong e grandes áreas do Sudeste Asiático.

Estão a surgir cada vez mais propostas para mudar o calendário dos Jogos Olímpicos de Verão, de forma a que não coincida com o pico de calor, o que até já foi feito. Sydney, que é sufocante no verão, acolheu os Jogos Olímpicos de 200 em setembro e outubro, durante a primavera do Hemisfério Sul. O Rio de Janeiro, no Brasil, foi anfitrião dos Jogos Olímpicos de agosto de 2016, quando as temperaturas de inverno registam uma média confortável de 21º graus Celsius ou mais.

Cidades no noroeste da Europa - como Londres, Oslo e Estocolmo - podem tornar-se mais atrativas para acolher o evento, enquanto cidades do Mediterrâneo - incluindo Palermo, na Sicília, e Sevilha, em Espanha - estão, na sua maioria, acima do limite. Cidades sul-americanas de alta altitude também podem tornar-se mais apelativas à medida que as temperaturas globais aumentam.

Os candidatos para os Jogos de 2036

Os próximos Jogos Olímpicos Verão realizar-se-ão em Los Angeles, cidade cuja temperatura é agradavelmente moderada pelo frio do Oceano Pacífico. Os Jogos Olímpicos de 2032 estão agendados para Brisbane, no estado australiano de Queensland, uma cidade que fica tão quente no verão vai acolher o evento durante o inverno no final de julho — ideal, já que é verão na maior parte do mundo. Um inverno em Brisbane não vai muito abaixo dos 10ºC.

Mais de 10 países já expressaram interesse em acolher os Jogos Olímpicos de Verão de 2036, segundo alguns relatos, mas apenas seis tornaram as suas candidaturas públicas ou oficiais: a Índia está a concorrer com a sua cidade ocidental de Ahmedabad e a Indonésia com a sua ua nova capital em construção, Nusantara. O Catar está a concorrer com Doha, enquanto a Turquia propôs Istambul. Polónia e Chile sugerem as suas capitais, Varsóvia e Santiago, respetivamente.

Pelo menos metade das cidades que se candidataram para acolher os Jogos Olímpicos de Verão 2036 podem experienciar temperaturas inseguras

Três países - Índia, Indonésia e Catar - na Ásia e no Médio Oriente querem acolher os Jogos Olímpicos de 2026, mas suas temperaturas médias no verão podem exceder os limites considerados seguros. Chile, onde as estações do Hemisfério Sul estão invertidas, apresenta as condições mais ideais, seguido da Polónia

Quase todos estes países vão ultrapassar, em algum momento, o limite de stress por calor, segundo os dados da CarbonPlan. Apenas Santiago está abaixo do limite durante todo o ano, incluindo na altura mais quente do verão. Ahmedabad e Doha estariam bem acima do limite nos meses de verão, mas poderiam destacar-se nas suas estações mais frias.

“Em grande parte do mundo, o pior calor do ano infelizmente coincide com a época dos Jogos Olímpicos de Verão”, indicou à CNN Oriana Chegwidden, cientista climática da CarbonPlan. “E o calor pode, de facto, representar riscos significativos para os países que se candidatam para os Jogos Olímpicos em 2036.”

Se esses países fossem os escolhidos, os riscos de calor poderiam ser reduzidos com a implementação de algumas medidas simples, sugere Oriana Chegwidden: “Por exemplo, a organização poderia mitigar os riscos de calor começando [os Jogos Olímpicos] antes ou depois do pico do verão, ou até agendando os eventos à noite ou ao início da manhã, quando está mais frio.”

Os países podem considerar concorrer aos Jogos Olímpicos com cidades com climas mais frios, como aquelas situadas em altitudes mais elevadas, acrescenta a cientista climática.

Estas cidades já acolheram os Jogos Olímpicos uma vez, mas podem não voltar a fazê-lo

Algumas das cidades que já acolheram os Jogos Olímpicos de Verão estarão muito além das temperaturas seguras até 2050.

Pequim, cidade-anfitriã em 2008, seria muito quente e húmida, estimando-se um stress por calor previsto superior a 32 graus Celsius. Atenas, Roma, Atlanta, Tóquio e Seul também seriam demasiado quentes, tal como Barcelona.

Até 2050, quase metade das cidades que já foram anfitriãs dos Jogos Olímpicos de Verão poderão ultrapassar as temperaturas de segurança

À medida que o mundo aquece, quase metade das anteriores ou futuras cidades anfitriãs dos Jogos Olímpicos de Verão correriam o risco de ultrapassar uma temperatura do globo húmido de 27 graus Celsius - o limite que o Colégio Americano de Medicina Desportiva (ACSM, na sigla em inglês) estabeleceu para cancelar a atividade física contínua.

As cidades do Hemisfério Sul, como Sydney e Brisbane, na Austrália, assim como o Rio de Janeiro, no Brasil, tecnicamente estão na lista de regiões muito quentes, mas ainda podem acolher o evento durante as suas estações mais frias.

Não é como se o mundo só fosse ver isso acontecer em meados do século. Os Jogos Olímpicos de Tóquio 2020 — realizados em 2021 depois de a pandemia ter impedido a realização do evento na data inicial — foram os que decorreram sob maior calor, com o stress térmico a ultrapassar em larga medida o limite de segurança - acima de 32 graus Celsius.

Cerca de um em cada 100 atletas sofreu de doenças relacionadas com o calor nos Jogos Olímpicos de Tóquio. Curiosamente, nenhuma pessoa foi hospitalizada, em parte devido aos preparativos do Japão.

Como ficou claro que um impacto extremo atingiria a capital japonesa - uma cidade densamente construída de arranha-céus que retêm o calor urbano - a organização mudou os eventos de maratona e caminhada para a cidade mais fria e montanhosa de Sapporo. Ainda assim, o clima estava muito quente e húmido, e seis atletas sofreram com insolação por esforço, que é causada por atividade intensa debaixo de calor extremo, que pode levar à falência de órgãos e até provocar morte.

Yuri Hosokawa, professora assistente de ciências do desporto na Universidade Waseda, no Japão, liderou o plano de resposta ao calor em Sapporo para os Jogos Olímpicos em Tóquio.

“Insolação por esforço, a forma mais grave de doença causada pelo calor. Quando isso acontece, precisamos de garantir que a pessoa é tratada imediatamente, idealmente dentro de 30 minutos após o colapso”, indicou à CNN. “E para que possamos fazer isso, precisamos de estabelecer um protocolo que permita que os atletas não sejam transportados para o hospital, mas sejam realmente tratados no local.”

Hosokawa e as suas equipas trataram casos de insolação e exaustão pelo calor, mergulhando os atletas em banhos de gelo para reduzir as suas temperaturas corporais. Alguém que esteja a sofrer com uma insolação é incapaz de regular a sua temperatura corporal — reduzir sua temperatura corporal sem ajuda externa.

“Imersão em água fria, ou banho de gelo, é a maneira mais eficiente de arrefecer alguém rapidamente”, afirmou Hosokawa. Mas alguns atletas em Tóquio hesitaram em tomar um banho de gelo e, se ainda não estivessem no ponto de insolação, eram tratados com toalhas embebidas em água gelada.

Hosokawa é uma dos vários especialistas que pedem às comunidades desportivas de todo o mundo para que mudem a forma como os eventos desportivos são programados, mas também que aliviem certas regras. Um exemplo simples de aplicar seria permitir mais substituições num jogo de futebol para evitar esforços excessivos por parte dos atletas.

“Se simplesmente cancelarmos eventos desportivos quando estiver quente, isso pode seriamente tirar uma oportunidade a todos. Eu amo desporto e quero que a cultura desportiva permaneça, e quero que os meus filhos também pratiquem desporto quando crescerem. Mas se quisermos fazer isso, precisamos de pensar seriamente em mudanças de regras e programação”, argumentou.

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